Traduções selvagens

“Arranje uma sopinha” de Fernando Gabriel no Diário Económico.

A avaliar pelo escárnio e maldizer que por aí vai a propósito do “inglês técnico” do primeiro-ministro, dir-se-ia que vivemos num país culturalmente sofisticado, onde o conhecimento linguístico e o cuidado na conversão entre diferentes idiomas são a norma.(…)

As traduções cinematográficas, que se suporia mais cuidadosas, vão pelo mesmo caminho das televisivas. Por exemplo, como se não fosse suficiente ver a obra de Evelyn Waugh transformada numa ordinarice pegada, o tradutor de Brideshead Revisited (2008) decide participar no desastre dando um contributo de originalidade que ninguém lhe encomendou. Quando Charles Ryder recebe uma mensagem de Sebastian Flyte, garantindo estar “gravemente ferido”, decide regressar para junto do amigo e anuncia a decisão ao pai, que lhe responde com ironia: ‘well, I shall miss you, my boy, but don’t hurry back on my account’. O tradutor converte a ironia em materialismo: “não venhas a correr para o meu dinheiro”. O motivo do equívoco é penosamente evidente, ou ‘feathery obvious’, como diria o tradutor, a quem apetece responder por interposto Sebastian: ‘my dear, I should like to stick you full of barbed arrows like a p-p-pin-cushion’.

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Comentários

  • LA  On 21/10/2010 at 11:03

    Confirmo que a legendagem do filme Brideshead Revisited (versão 2008; não confundir com a série dos anos 80) é a coisa mais desastrada que alguma vez vi num écran.

    Para um leitor devoto de Waugh (que aprecia a forma única como usa o inglês para marcar as personagens), foi muito penoso assitir a tal tradução e saí da sala com bastante vontade de castigar fisicamente o autor do crime e as bestas que o deixaram praticar tal acto.
    O que vai valendo é que ainda há filmes que não são dobrados.

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